sexta-feira, 24 de julho de 2009

Matéria em movimento e constante evolução Da bactéria à baleia azul. Das árvores ao espaço

Matéria originalmete publicada em A Nova Democracia

O desenvolvimento do capitalismo e o aumento da dominação da Europa sobre o mundo teve consequências importantes sobre o desenvolvimento da biologia no século XIX. Existiam agora nos museus coleções de animais e plantas realmente de alcance mundial, o número de espécies conhecidas era tão grande e crescia em uma velocidade tão rápida, que um casal de cada uma delas não mais caberia em uma arca durante um dilúvio.
Já se tinha a idéia da existência de ordem na natureza e o sistema de nomenclatura de Lineu é prova disso. No entanto, o que se tentava até então era entender a ordenação do plano de criação divina. Demonstrar que a diversidade de espécies com suas semelhanças e diferenças é fruto do movimento da matéria, ou seja, de causas naturais, era questão de tempo.

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Darwin e Wallace




Alfred Russel Wallace foi o oitavo de nove filhos. Trabalhou como aprendiz de construção e professor, tornando-se posteriormente coletor profissional de espécies. Nunca deixou de estudar por conta própria. Em 1848, junto com outro naturalista, Henry Walter Bates, realiza importante expedição à bacia amazônica, coletando cerca de 1300 espécies de insetos nos primeiros dois meses. Mesmo depois de um incêndio em seu barco ter destruído grande parte da coleção, escreveu Viagens pelos rios Amazonas e Negro. De 1854 a 1862 viajou pelo arquipélago malaio, observou que existiam duas faunas distintas na zona estreita do arquipélago, formando uma espécie de fronteira zoogeográfica, hoje conheci da como Linha de Wallace, uma descoberta importante no estudo da distribuição e evolução dos seres vivos.
Charles Darwin era o quinto de seis filhos de um médico de família abastada da Inglaterra, nascido em 1809. Estudou medicina em Edimburgo, mas se interessou mesmo pelas sociedades estudantis para naturalistas. Dado seu desinteresse por medicina, seu pai o matriculou na Universidade de Cambridge, em um bacharelado em artes. A idéia era que se tornasse clérigo, dado o fato de muitos deles serem naturalistas, pois "explorar as maravilhas da criação de Deus" era uma de suas atribuições.
Por recomendação de um amigo embarca como naturalista, em uma expedição prevista para dois anos mas que dura quase cinco, acompanhando o capitão Robert Fitz Roy, no Beagle. A viagem do Beagle trouxe notoriedade a Darwin. Ocupou o cargo de Secretário na Geological Society e foi eleito membro da Royal Society, duas importantes sociedades científicas inglesas. Esta notoriedade foi na verdade o grande obstáculo para a publicação de suas idéias. Ele sabia que seria taxado de herege pela igreja e sofreria grande resistência no meio científico. Quem tem muito a perder teme as mudanças.
Por outro lado, sabia que seria questão de tempo até que alguém publicasse uma teoria evolutiva que fosse convincente. Continuou trabalhando em segredo. Estudou animais domésticos, cracas, vegetais, e foi elaborando sua teoria.
Wallace, por outro lado não tinha muito a perder, era respeitado, mas não tinha a notoriedade de Darwin, não tinha fortuna nem "um nome a zelar". Durante sua extensa expedição na Malásia (1854-1862) formulou o princípio da seleção natural, embora não tenha usado este nome, e outras importantes descobertas, como a própria linha de Wallace. Wallace havia publicado em 1855 um artigo intitulado Sobre a Tendência de as Variedades Divergirem Indefinidamente do Tipo Original (On the Tendency of Varieties to Depart Indefinitely From the Original Type). Após esta publicação, continua buscando compreender o mecanismo da evolução. Muito doente de malária, na ilha de Giolo, Indonésia, formulou o princípio da seleção natural. Em 9 de março de 1858, enviou um artigo e uma carta de apresentação a Darwin, expondo sua descoberta. Acredita-se que esta carta tenha chegado à mansão de Darwin por volta de três ou quatro de junho de 1958.
Dois cientistas, Lyell e Hooker, convencidos de que seu amigo Darwin deveria receber o reconhecimento de prioridade, decidem que o trabalho de Wallace deveria ser apresentado juntamente com um excerto de um ensaio de Darwin, sobre a seleção natural. Se encarregaram ainda de escrever notas introdutórias enfatizando que a descoberta era de Darwin. O artigo de Wallace, que nem sequer foi consultado, foi apresentado por último.
Os textos se concentram na seleção natural e na divergência das espécies, e não nos argumentos gerais para a evolução. Um ano depois, fim de novembro de 1859, é publicado o livro de Darwin, A Origem das Espécies.

A Teoria e suas implicações

A seleção natural, como formulada por Darwin, em poucas palavras se resume na "competição e sobrevivência do mais apto" o que nos leva a um raciocínio circular, assim:

  • Quem sobrevive?

    • Os mais aptos.

  • Quem são os mais aptos?

    • Os que sobrevivem.



Ou seja, os que sobrevivem são os mais aptos e os mais aptos são os que sobrevivem em progressão ao infinito. Na época da publicação da teoria, a genética dava seus primeiros passos com Mendel, cujo trabalho Darwin conhecia. Ocorre que a abordagem de Mendel procurava explicar a constância dentro das espécies. Em outras palavras, que as variações eram produto de "fatores constantes dentro de cada espécie". Enquanto a de Darwin e Wallace era focada na diversificação.
Perceberam um fato importante: as espécies evoluem ao longo do tempo, uma se transforma em outra, elas interagem entre si. No entanto, faltava uma questão fundamental. Qual é a "matéria-prima" sobre a qual a seleção natural age? Justamente não conseguiram relacionar suas descobertas com as de Mendel. O que só foi feito mais tarde, já no século XX pelos chamados neo-darwinistas.
Basicamente um indivíduo mais saudável, ou mais atraente teria mais facilidade de se reproduzir e passar seus genes para a geração seguinte. Um exemplo de laboratório pode ilustrar isso.

  1. Em um ambiente fechado foi cultivada uma colônia de moscas da fruta, eram colocados potes com pasta de banana e outros com pasta de peixe. A grande maioria das moscas colocava seus ovos na banana.
  2. Passou-se a eliminar os potes com banana, tão logo surgissem larvas.

  3. Ou seja simulou-se uma situação onde comer banana fosse letal para as larvas. Sendo assim as moscas que colocassem seus ovos no peixe seriam as únicas com possibilidades de sobreviver.

  4. Ainda assim a grande maioria das moscas nascidas no peixe colocavam seus ovos na banana, mas a percentagem caía de geração em geração.

  5. Após algumas gerações a grande maioria das moscas colocava seus ovos no peixe.


O que o experimento procura demonstrar é que as espécies possuem uma gama de possibilidades em seu patrimônio genético e que modificações ambientais podem "selecionar" algumas delas.
O papel histórico de Darwin, Wallace e seus sucessores tem sido o de demonstrar que a infinidade de espécies existentes ou extintas são fruto do movimento universal da matéria, evoluem em um processo constante e não são fruto de nenhum plano ou da obra de nenhum criador. Os seres vivos tem possibilidades múltiplas, que dependendo das condições do meio ambiente em que vivem podem evoluir em diferentes direções.
Com este conhecimento o homem foi capaz de desenvolver em um ritmo acelerado algo que já fazia a muito tempo, transformar e manipular as espécies. O melhoramento genético, a clonagem e a transgenia são exemplos disso. Óbvio que sob jugo do capital em sua fase superior, o imperialismo, estes avanços são monopolizados e conduzidos em função do lucro e da dominação, não importando as consequências. Mas mesmo assim são corroborações inquestionáveis da teoria da evolução.
Outro passo importantíssimo está prestes a ser dado. Cientistas conseguiram sintetizar artificialmente o genoma de uma bactéria e reproduzi-lo em outras num passo decisivo para a criação da vida artificial. Mais uma vez, cabe a ressalva: a quem esse conhecimento pode servir sob o imperialismo? Porém, criar vida artificial é "roubar" mais uma atribuição do pretenso criador.
Seria esse então o fim cabal e definitivo do criacionismo? De forma alguma! O que sustenta o criacionismo, há muito tempo, não são os fatos, mas a superestrutura. É notório que muitas das descobertas e avanços aqui citados foram dadas em laboratórios no USA, que hoje ensina o criacionismo em suas escolas.

Antes de Adão

Se admitir que espécies são capazes de evoluir e se transformar sem interferência externa, já era considerado uma heresia, afirmar que "a imagem e semelhança do criador" era simplesmente um primata que desceu das árvores e aprendeu a falar era inaceitável. Até hoje esta é a consequência da teoria da evolução que gera maior polêmica. Argumenta-se que não existem formas de transição entre os macacos atuais e o homem, ou ainda, que nem mesmo no registro fóssil existe um pretenso "elo perdido" entre símios e humanos.
Os seres humanos e alguns macacos atuais, como chimpanzés e gorilas tem ancestrais comuns, mas não descendem diretamente deles. Portanto, esperar encontrar espécies transitórias entre eles seria absurdo. Por outro lado, quando se fala em registro fóssil, não se trata de história amplamente documentada, mas de evidências relativamente raras e fragmentárias. É possível estabelecer que duas espécies tenham um ancestral comum, mas não que uma seja ancestral da outra. Quando a população de uma espécie se divide, as diferenças se acumulam lentamente, sendo difícil acompanhar, na natureza, esta transformação. Consegue-se ver seus resultados e a partir deles inferir o processo.
No que diz respeito à espécie humana, no entanto existe outra discussão de suma importância. O que permitiu ao homem descer das árvores, ocupar todos os rincões do planeta e chegar ao espaço em um tempo relativamente curto? Qual foi o diferencial que permitiu a esta espécie dominar o planeta, manipular a evolução e a natureza?
A resposta a esta pergunta foi dada ainda no século XIX, por Friedrich Engels, em Humanização do macaco pelo trabalho.

“O trabalho é a fonte de toda a riqueza, afirmam os economistas. E o é, de fato, ao lado da natureza, que lhe fornece a matéria-prima por ele transformada em riqueza. Mas é infinitamente mais do que isso. É a condição fundamental de toda a vida humana; e o é num grau tão elevado que num certo sentido, pode-se dizer: o trabalho, por si mesmo, criou o homem. (o grifo é nosso).”

Um passo decisivo na evolução do homem foi o andar bípede (ereto). Os macacos antropóides atuais, chimpanzés, gorilas, etc., podem andar em posição bípede, mas normalmente andam apoiando-se nas quatro patas. Este fato indica que a possibilidade de andar sobre as duas patas traseiras estava presente no ancestral comum a estas espécies. Da mesma forma que a divisão de trabalho entre os pés e as mãos. Enquanto os pés são usados principalmente para fixação nas árvores as mãos servem primordialmente para colher frutos, capturar pequenos animais, construir ninhos, etc. Mas, em comparação com as mãos humanas, as mãos símias podem ser consideradas toscas, apesar de a disposição de ossos e músculos serem as mesmas o desenvolvimento destes é bastante distinto, tendo as mãos humanas a possibilidade de realizar um número de movimentos infinitamente maior. Isto e um desenvolvimento estupendo do cérebro foram se influenciando mutuamente.
Pequenas modificações nas mãos, que permitissem maior precisão no arremesso, ou uma manipulação durante a marcha tornariam mais interessante a marcha bípede e um indivíduo que conseguisse andar sobre duas patas com maior eficiência levaria maior vantagem na caça e consequentemente na alimentação e reprodução, tendendo a passar seus genes às gerações seguintes, com uma tendência a sua fixação. O desenvolvimento do cérebro é amplamente influenciado por estes fatos. A possibilidade (proporcionada pelo cérebro) de perceber que se pode quebrar um pedaço de pedra de forma a transformá-lo em uma arma mais eficiente, junto com a possibilidade (proporcionada pela mão) de executar isto, transformando em tecnologia, aliados a uma possibilidade de se deslocar de maneira mais eficiente (posição ereta) para o uso desta tecnologia, permitiram um grande salto na separação do homem dos outros animais.
O aumento na quantidade de carne na alimentação1 também foi decisivo para o desenvolvimento da espécie, tanto pelos problemas que a caça e, depois, a criação ofereceram para serem resolvidos, quanto pela quantidade de aminoácidos e energia oferecidas de forma concentrada.
Os primatas essencialmente são seres sociáveis, o aumento da eficiência do trabalho aproximava cada vez mais os membros da sociedade. Uma questão é fundamental para desenvolver mais estas relações e aumentar ainda mais a eficiência do trabalho: a comunicação. Um grupo que se comunicasse melhor entre si poderia planejar melhor a caçada, dividir melhor o trabalho, transmitir melhor suas experiências. O desenvolvimento da fala articulada era uma necessidade para nossos ancestrais continuarem seu desenvolvimento. Portanto, modificações na laringe que possibilitassem um aumento na quantidade de sons que pudessem ser emitidos seria vantajosa e fixada ao longo do tempo.
Assim, passo a passo, a horda de primatas arborícolas foi se transformando na sociedade humana que conhecemos.

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